
O gato, astuto, observa o novelo de lã. Suas pupilas, de gato, verticais, registram o novelo como um código de barras: não piscam. Sua língua, de gato, umedece os seus bigodes de gato cuidadosamente. Suas unhas, de gato, retráteis, saltam à frente. O novelo, fofo, farto, oferece às unhas, língua, bigodes e pupilas de gato (e ao próprio gato) um promissor passa-tempo. O novelo, imóvel, intacto, como um gato prestes a dar um bote de gato, espera pelo gato que, imóvel, prepara o seu bote de gato. Num pulo de gato, o gato salta um salto certeiro, atingindo o novelo que, mesmo sem ser gato, mas sendo novelo e por isso farto e fofo, saltou como um gato ao contato das unhas retráteis do gato, em seu bote de gato. Saltou ainda mais que um gato, ainda mais alto, ainda mais vezes, o novelo, pois era fofo e o chão duro, como previu o astuto gato. E o novelo, enquanto farto e fofo, distraía o gato e sua curiosidade de gato, com suas patadas de gato, certeiras ao desenrolar o novelo. E o novelo de lã, lã de algodão (pois pra ser fofo, o novelo, tem que ser de lã de algodão), pulava os seus melhores pulos de gato, mostrando seus nós, embaraços, voltas e laços, que entretinham, de fato, o gato. O gato, ao desenrolar da brincadeira, ao desenrolar do novelo, ao sentir entre as unhas de gato o algodão do novelo, embaraçando-se e se desembaraçando aos seus movimentos de gato, sentia-se farto e fofo, não como um novelo, mas como um gato.
Até que por fim em linha reta estende-se o novelo que sem nós laços voltas ou embaraços nem fofura nem fartura nem pulos não pode ser novelo assim em linha reta nem pode entreter o gato e no entanto mesmo assim em linha reta nunca deixará de ser algodão...